sábado, 23 de março de 2013

A árvore da Pompeu Loureiro

Uma frondosa e centenária árvore em Copacabana, de nome engraçado, chamou a atenção da cidade inteira. A prefeitura cismou que a pobre-coitada estava doente e queria derrubá-la.

Os moradores, cientes da história da árvore e desconfiados da pressa da prefeitura, impediram o tombamento. Engajaram campanha e amanhã farão caminhada na praia pela vítima.

Mas qual é o nome da árvore?

Todo mundo escreve assacu, mas — oh! — o certo é açacu. Inclusive o texto da placa no tronco da dita cuja está grafado errado.

Eu estava desconfiado desde que o imbróglio começou. A razão pela qual escrevemos açacu e não assacu é a mesma por que o certo é muçarela e não mussarela. Recordem aqui.

Ocorre que os tupis a batizaram primeiro, e manda o bom Português que tudo do tupi com som de S vira Ç.  De fato, você conta centenas de exemplos, todos com Ç. Por que açacu seria diferente?

Então, estamos combinados: vamos lutar para salvar o açacu da Pompeu Loureiro.


terça-feira, 19 de março de 2013

Desabrigados e desalojados

Com as chuvas voltando a castigar o Estado do Rio (e infelizmente fazendo vítimas), retornam às notícias os termos desabrigados e desalojados.

A rigor, pelo dicionário, são sinônimos. No jornalismo — e acredito que no jargão dos bombeiros e da Defesa Civil também —, há uma pequena diferença.

Um desabrigado é aquele que perdeu tudo: sua casa foi destruída pelas águas ou por deslizamento de terra.

Já o desalojado é o sujeito que teve de sair momentaneamente de casa, seja por ela estar em área de risco, podendo cair, seja por ela ter sido inundada. Pode voltar a morar lá, se assim o considerarem as autoridades competentes.

Diferenças à parte, ambos precisam da boa ação de voluntários e sobretudo de doações.

terça-feira, 12 de março de 2013

Algarismos romanos

O que têm a ver algarismos romanos com a Língua Portuguesa?

Muita coisa, já que eles ainda são bastante frequentes. Volta e meia aparecem em nomes de lugares, colados em monarcas e, sobretudo agora em tempos de conclave, ordenando Papas.

Lá no jornal eu propus acabar com os romanos. A Folha de S.Paulo, por exemplo, já os aboliu por lá.

Polêmica à vista!

Num jornal popular, o algarismo romano pode causar estranheza. Claro, há os consagrados, como Praça XV e João Paulo II, e os mais simples, como Marcelo III (um dos inúmeros possíveis novos nomes do sucessor de Bento XVI).

Mas o próprio nome escolhido por Joseph Ratzinger não é dos mais fáceis, concordemos.

Há uma lenda urbana que reproduz a dúvida de um pedestre no Centro do Rio: "Amigo, por favor, onde é a Praça Piócs? Era a Pio X, ali perto da Candelária. E possivelmente há quem se refira àquela via que corta o Morro Azul, no Flamengo, de Rua Paulo Vi.

Acabar com os romanos seria um brinde à ignorância e ao empobrecimento ou um movimento de clareza e simplificação?

Talvez possam contra-argumentar que abolir os romanos é o mesmo que relaxar na norma culta.

Eu não sei; acredito que há, sim, espaço para tolerar erros, pois nenhum fundamentalismo é bacana. Mas a norma culta se fortaleceu como o correto; os romanos, no meu entender, sempre foram uma alternativa. Nunca foi errado escrever Praça 15 no lugar de Praça XV.

(No caso dos topônimos, ou nomes de lugares, sempre defendi o uso dos arábicos. Não fazia sentido escreverem Praça XV e não Boulevard XXVIII de Setembro, o que realmente é esquisito.)

Romanos persistem mais por tradição do que por funcionalidade. São como roupagens bonitas, mas que não chegam a todos os leitores. Principalmente num jornal. Por isso, defendi o ajuste definitivo.

Era comum grafar em romanos o ano de criação de alguma obra (filmes, por exemplo). Vamos lá, quem consegue de prima dizer quando foi MCMLXXVIII? Dica: foi o ano em que nasci. Estou velho.

Com a virada para o século 21, a coisa simplificou. É simples escrever MMXIII. Mas não é mais simples 2013?

O que vocês acham?

segunda-feira, 11 de março de 2013

E nem

Sabem o Exame Nacional do Ensino Médio? É o Enem.

Tem um 'quase xará', o e nem. Quando aparece lá no jornal, eu brinco: "E nem é o Exame Nacional do Ensino Médio".

Isso porque na maioria das vezes o e está sobrando na frase.

Muitas pessoas se esquecem de que o nem equivale a e não. Usamos em enumerações em frases com ideia negativa.

Não fomos à praia nem conseguimos ingressos para o cinema.

O governo não baixou os impostos nem concedeu empréstimo.

Bastante gente coçaria a mão para botar um e antes dos néns. Está errado? É crime hediondo? Eu diria que é uma repetição desnecessária. Logo, fica mais elegante se você for econômico.

Mas há uma situação, pelo que me lembro, em que o e nem é obrigatório. É quando o nem traz a ideia de mesmo. Aliás, vocês podem usar o mesmo como teste. Vejam:

Fiquei triste, nem quis sair do quarto, e nem meu cachorro conseguiu me animar.

Deu para entender a diferença? O primeiro nem equivale a e não (na verdade, se eu colocasse apenas não a frase continuaria certa); já no segundo, a gente pode inserir mesmo sem mudar o sentido.

terça-feira, 26 de fevereiro de 2013

A tsunami ou o tsunami?

Houaiss diz que é masculino.

Mas não vem de onda? E onda não é feminino?

Vai entender.

Ah, tsunami vem do Japonês: tsu (porto) e nami (onda ou mar). Logo, é a onda do porto? Talvez seja a onda que quebra no porto. Ou que quebra o porto...

E aí deixo vocês com a 'Grande onda de Kanagawa', do mestre Hokusai.


Tromba-d'água e cabeça-d'água

Ambas têm a ver com chuva e podem ser devastadoras, mas não são a mesma coisa. A primeira, inclusive, pode ser causa da segunda.

Uma tromba-d'água é a velha chuva de verão: aquele toró que desaba de uma vez só, geralmente no fim do dia, e que causa transtornos bem na volta para casa. Em suma, é uma chuvarada curta e grossa.

A cabeça-d'água também é curta e grossa e até vem 'de cima'. Igualmente faz estragos no chão. Mas depende de um rio. É aquela súbita cheia que ninguém espera e que pode arrastar o mais incauto.

Meu pai sempre me contou de cabeças-d'água. Tanto, que a recomendação era não tomar banho de rio e evitar margens quando chovia no alto da montanha, mesmo se cá embaixo tivesse sol. Bastava uma tempestade lá em cima para o leito absorver a água e aumentar o volume do rio.

Quilômetros abaixo, com a força da gravidade, o rio se transforma em onda, mas ela é traiçoeira e chega sem avisar.

Muita gente perdeu a vida assim.

Então, uma tromba-d'água no alto do morro pode provocar uma cabeça-d'água rio abaixo.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2013

Gente, vamos aceitar a muçarela!

Confesso que torcia o nariz para muçarela.

Sei lá, achava um troço horrível, uma aberração, uma mutação genética da Língua Portuguesa.

Eu era tão fundamentalista que defendia mussarela. Como numa desobediência civil.

Dicionários colaboravam com esse motim e previam mozarela e o italiano muzzarela.

Mas aí a pessoa estuda, envelhece e evolui. E passei a sentir pena de muçarela.

Dia desses meu mestre Sérgio Duarte Nogueira estava justamente explicando por que não devemos tacar pedra em quem escreve muçarela. E os alicerces do Português corroboram a tese.

Palavras em Tupi são escritas com Ç, como açaí e suçuarana. O Italiano e o Espanhol também pedem Ç quando temos Z, como é o caso de plaza e piazza. Não escrevemos prassa. É praça. Por isso, muçarela.

Vamos acabar com anos de preconceito! Vamos dar à muçarela o reconhecimento que a palavra merece!

Todos comemora e nós pega o peixe

Vocês se lembram da polêmica do nós pega o peixe?

O bafafá já vai fazer dois anos: foi em maio de 2011. Um livro com o aval do MEC defendia a tese de que construções com erro de concordância podiam ser aceitas, não eram crimes hediondos. Era o Por uma vida melhor, da coleção Viver, aprender.

Na ocasião, logo me veio à cabeça a moda do #todoschora e afins. Parece que passou, porque não vejo muitas hashtags como aquela por aí.

Houve caça às bruxas às autoras, que depois desconversaram, alegando que jamais quiseram ensinar errado.

Sei não: na minha época, livro didático era espécie de bíblia; o que lá estava era verdade absoluta, não podia ser questionado. Acredito que hoje, mais do que nunca, essa aura deva ser mantida.

Se existe norma culta, o livro deve ensiná-la e estimulá-la. Isso é bem diferente de discriminar erros e tratar mal quem errou.

quarta-feira, 28 de setembro de 2011

Por quê?

Esta postagem é uma resposta a Paty, que gentilmente foi aos comentários do blog com a seguinte dúvida: como se usam os porquês?

(Parêntese: em Portugal a lógica que veremos abaixo é ignorada, sabe-se lá por quê.)

Vamos ao mais fácil. Escrevemos porquê quando este for um substantivo, sinônimo de motivo. É importantíssimo colocar um artigo antes. Assim, temos:

Eu não entendi o porquê desse ataque de pelanca.

Você sabe usar os porquês sem errar?

Dito isso, vamos em frente, agora com as perguntas e respostas.

É uma armadilha dizer que, nas perguntas, teremos sempre por que e, nas respostas, porque. Há exceções, mas, a rigor, é mais ou menos isso.

Tenho uma dica. Se você puder acrescentar a palavra razão, teremos por que.

Falaram por que [razão] o show atrasou tanto?

Viram que a razão não alterou o sentido da frase?

Quando o por que vier no fim, coladinho ao ponto final, manda a regra que o acentuemos.

O show atrasou tanto por quê?

Quando respondemos, temos porque.

O show atrasou porque a cantora fez uma festinha no camarim.

Há, ainda, uma quarta situação. O por que, separado, pode significar pelo qual.

A estrada por que viemos está toda esburacada.

Notem que se a gente tentar botar a razão a frase perde o sentido.

Mas o que seria a língua sem as exceções, não?

Podemos ter o por que razão numa afirmação e o porque numa pergunta.

Eu fiquei horas imaginando por que o show atrasou tanto.

porque o show atrasou você quis ir embora?

Não tem por que você ir agora.

Entenderam as diferenças? Depois a gente explica cada uma.